quarta-feira, 20 de junho de 2012

A voz da experiência

ALTO PREÇO

(Hortêncio Pessoa)

A sociedade de um modo geral, costumava rotular às pessoas com mais
de sessenta anos, de "sexagenários". Atualmente, deram ao grupo uma
denominação mais original: "grupo da melhor idade".
Será mesmo? Tenho lá minhas dúvidas!
Quando atingi esse estágio, comecei a pensar nas vantagens que eu
poderia absorver; bem como, o outro lado da moeda...
Confesso que a princípio relutei para aceitar a nova realidade! Isso cheirava a
discriminação disfarçada ou ainda a pura demagogia.
Minha primeira atitude foi fazer valer os meus direitos de usuário de
transporte coletivo. Cadastrei-me e recebi o passe livre. Sendo eu cego e agora
engajado no citado grupo.
Finalmente eu conquistara o direito de "ir e vir".i
Qual não foi minha surpresa, quando ao tentar entrar pela porta
dianteira, mesmo apresentando a carteirinha, o motorista me rejeitou,
alegando super lotação.
Logo a seguir outro ônibus parou e a mesma cena se repetiu.
Consegui embarcar, seguindo no terceiro ônibus. Outra surpresa, a cadeira
destinada aos idosos, gestantes e deficientes, estava ocupada por uma
adolescente, que fingia dormir. Foi alertada pelo motorista que disse
que só seguiria a viagem, depois que alguém me cedesse o lugar.
Resolvido o impasse, agradeci ao mesmo e elogiei o gesto.
Não satisfeito, resolvi ligar para a Empresa. O atendente, foi logo
perguntando qual era minha reclamação. Disse-lhe então, que se tratava
de um elogio a um funcionário da citada Empresa, relatando o ocorrido.
O atendente anotou os dados e prometeu-me que iria afixar no
flanelógrafo para que todos tomassem conhecimento.
Quinze dias se passaram e encontrei-me com o citado motorista, numa fila
de ônibus, desta vez como usuário. Abraçou-me amistosamente, ao mesmo
tempo, que confessou-me desapontado que havia sido dispensado do
emprego. Disse-me também não estar arrependido de sua ação e que faria
novamente a mesma coisa se fosse preciso.
Fiquei constrangido e sem saber o que lhe dizer, afinal de contas
esperava que iria beneficiá-lo.
Desde então, tenho ouvido atentamente as conversas paralelas no
interior dos coletivos;
Tenho presenciado cenas degradantes, hilárias, das quais vez por outra
sou um dos protagonistas.
Resolvi tirar partido da situação, passei a escrever crônicas. Para quem
não vivenciou os fatos, parecerão mirabolantes. Creiam, são realmente
autênticos. Me aguardem!

Fortaleza, 20 de abril de 2007

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